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domingo, 17 de junho de 2012

Tradução da Vida

Neste mundo material não se pode ser apenas espiritual, mas não é necessário ser sensual, olhar com sagacidade, não é necessário ter poder sobre o corpo, cobiçá-lo sem a alma, basta trazer beijos puros de volta dos lábios que os ungiram, sair da terra possuída e entrar na carne santificada, moldar existências em mãos com centelhas vestidas de crepúsculos espargindo flores da montanha que conquistam as enchentes, maiores que pesadelos milionários e maquiavélicos que abominam o toque aveludado do pêssego, o encontro carinhoso entre a água e a calha do rio despido, deslizando por entre seios, penetrando-os, enterrando-se neles, bem fundo, tão fundo que faz calar, como se fosse tirar um momento da sanidade, e o que poderia tirar momentos de ternura poderia também tirar uma eternidade de animosidade, e pouco se pode fazer sem os dois, sem a corda da esperança a qual se pendura, que lança devaneadores do presente sobre o vão que separa o passado do futuro, deixando pedras e paus fora do caminho, revelando tudo para Deus e o mundo, entrando em sintonia como duas cordas afinadas na mesma melodia, amadurecida para aprender a chorar e amar sem se ferir, para ter desejos instintivos e quase infantis, procurando por mãos estendidas, por estrelas que explodem, pelo cosmos que abraça, por papai e mamãe, por proteção contra os tiranos, contra as danças dos demônios, contra os computadores que aprisionam em noites solitárias, entregando-se a um entendimento mais intenso, deixando o pêndulo do destino balançar entre homem e mulher, levando-os e trazendo-os para onde se deseja estar, mesmo sabendo que nenhum lugar jamais pertencerá a alguém, nem em toda dor, nem em toda felicidade, mas somente em sonhos, porque sendo eles uma tradução do despertar da vida, esta é também a tradução  de um sonho.
Alceu Natali

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Momento Clariciano


A Descoberta do Mundo

Lutei toda a minha vida contra a tendência ao devaneio, sempre sem jamais deixar que ele me levasse até as últimas águas. Mas o esforço de nadar contra a doce corrente tira parte de minha força vital. E, se lutando contra o devaneio, ganho no domínio da ação, perco interiormente uma coisa muito suave de se ser e que nada substitui. Mas um dia ainda hei de ir, sem me importar para onde o ir me levará.